Danilo Cymrot, criminólogo e pesquisador, é Danilo Dunas em sua vida artística. Cymrot, seu sobrenome de família, era muito complicado para um cantor de ritmos populares como o forró. Essa dualidade acompanha a vida de Danilo, que já lançou seis álbuns, escreveu composições para musicais e peças de teatro e, paralelamente, é uma das principais referências acadêmicas do Brasil na pesquisa sobre criminalização do funk.

Danilo Cymrot, pesquisador e escritor, também é o músico Danilo Dunas
A escolha do nome artístico foi influenciada por um amigo, que sugeriu repetir a letra D. “Tem vários artistas: Gilberto Gil, Marisa Monte, Brigitte Bardot, Nelson Ned, Reginaldo Rossi, enfim”, explica. Sua carreira se inspira no movimento das dunas, sempre em transformação.
Em seus seis álbuns lançados, ele passeia por marchinha, frevo, rock, blues, country, forró, guarânia (gênero paraguaio), rancheira (gênero mexicano), tango e bolero.
Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo, Cymrot é autor do livro O funk na batida: baile, rua e parlamento (Edições Sesc), finalista do Prêmio Jabuti em 2023 na categoria Ciências Sociais.
Música de cabaré
A mistura de ritmos latinos e o humor das letras dão um toque de “música de cabaré” ao trabalho artístico de Dunas. “O tango, o bolero, o blues, são músicas muito tocadas nos cabarés. E quando falo cabaré, é no sentido amplo, porque você tem o americano, portenho, mexicano, brasileiro. O forró, por exemplo, é uma típica música de cabaré no Brasil, a música sertaneja também”, diz.
No humor, o compositor encontra campo para fazer crônicas. Em “Classe média sofre” — inspirada nos próprios amigos —, ele e Zeca Baleiro cantam: “Tive uma bad no show do Radiohead/ Quando você menosprezou meu poliamor/ Por que você não quer gentrificar comigo? Se eu sou DJ, designer, chef e ator?”.
Já “Põe coentro dentro”, dueto com a cantora Maria Alcina, veio de um almoço entre amigos em que houve uma discussão sobre quem gostava ou não do tempero. “Cada um come o que quer/ Seja homem ou mulher”, diz a letra.
O sarcasmo também faz parte das marchinhas que Dunas lança todos os anos para o Carnaval, desde 2016 — e que compõe sozinho ou com o parceiro Pedro Buarque. Uma delas é “Manda Nude”, que nasceu como uma décima (poema de forma rígida, com estrofes compostas por dez versos).
“Eu gosto muito de fazer poemas com essa temática pornográfica, escatológica. Meu grande mestre nesse sentido é o Glauco Mattoso, que me ensinou tudo. Publiquei esse poema nas redes sociais e as pessoas presumiram que era uma música.”
Depois do terceiro álbum, veio o convite para compor para musicais. O primeiro foi “Revista Babadeira”, peça de teatro de revista com elenco de drag queens dirigida por Neyde Veneziano. Paralelamente, seu amigo Kiko Rieser, dramaturgo, escrevia um monólogo sobre Dercy Gonçalves. Quando Dunas leu o texto, veio a inspiração para escrever a letra de “Só sei ser Dercy”, que foi musicada por Pedro Buarque e usada para encerrar a peça, encenada pela atriz Grace Gianoukas.
Uma peruca Luís XV
Com os primeiros R$ 25 que ganhou em sua vida, em um concurso de piano erudito, Danilo comprou uma peruca que imitava as usadas por aristocratas europeus para se fantasiar de Mozart. Por causa do filme “Amadeus” (1984), ele viu no compositor uma figura transgressora e irreverente. E, apesar de se apresentar em concertos já aos sete anos de idade, não se identificava com a música clássica.
“Ao mesmo tempo que eu tocava piano erudito, no dia a dia eu escutava muita MPB, porque era a música que meus pais ouviam na rádio. Eu comecei a me interessar cada vez mais por música popular”, conta.
Durante a faculdade, ele estava inserido em quase tudo que era artístico: fez parte do grupo de teatro, teve banda de rock, de brega e se desafiou a aprender sanfona, o que o aproximou do forró e do sertanejo. “Ao mesmo tempo que estava no mestrado, eu tocava profissionalmente a sanfona na noite, em bares, acompanhando duplas sertanejas. Quando meus colegas e professores da Faculdade de Direito descobriram essa minha faceta, chegaram a ir em bar lá na boca do lixo me ver tocar. Senti que tive até mais acolhida”, diz.
O funk na batida
Apesar de gostar de alguns dos subgêneros do funk, Danilo diz que o ritmo chamou sua atenção durante a pesquisa de temas para o mestrado.
“Até pensei em falar sobre o samba, mas ele já tinha sido muito pesquisado. Quis algo contemporâneo. Lembrei do funk, especialmente do proibidão, aquele acusado de fazer apologia do crime”, diz. Durante a faculdade, interessou-se pela Criminologia. Nesse campo, chamou sua atenção a teoria da subcultura delinquente, que abordava crimes praticados por jovens por meio das letras e rimas.
“É algo que vem desde a década de 1950 com a ideia de juventude transviada, do rock, e depois passa por práticas culturais que são consideradas vandalismo, como a pichação.” Outro campo de estudo que chamou sua atenção foi a Criminologia Crítica. “Ela é revolucionária porque muda a pergunta principal: os criminólogos param de questionar por que as pessoas cometem crimes e como evitá-los e passam a perguntar: por que algumas condutas são criminalizadas e outras não?”.
O funk foi escolhido por unir o que mais lhe interessava: música, teoria da subcultura delinquente e Criminologia Crítica. Em 2011, ele defendeu a dissertação de mestrado e em 2015, o doutorado, com um tema diferente — os deputados policiais militares da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
“Acabei voltando ao funk porque descobri, no meio da pesquisa, que os principais projetos de lei apresentados que buscam restringir bailes funk são propostos justamente por esses deputados, que são oriundos da Polícia Militar.”
O convite para o livro, lançado em 2022, veio da editora. O texto parte da dissertação de mestrado e complexifica um pouco mais a relação do Estado com o funk. Ao longo de sua pesquisa, ele percebeu que a relação não é só de criminalização: dentro dos parlamentos, por exemplo, existem políticos que lutam pelo reconhecimento do funk como manifestação cultural.
O livro também abordou pontos que, anos depois, geraram discussões sobre a falta de lazer e o abandono dos bairros periféricos. “Pude escrever sobre fenômenos que em 2011 ainda não existiam. Falei sobre os rolezinhos nos shoppings, os fluxos e como o poder público passou a lidar com eles, principalmente a partir de 2013, através da ‘operação pancadão’.”
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