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Opinião

Receita limita uso de créditos em ações coletivas e reacende debate jurídico

21 de novembro de 2025, 07h13

Recentemente, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa nº 2.288/2025 com o objetivo de restringir o uso de créditos por meio de ações coletivas.

Não é novidade que o Fisco, de modo geral, tem tentado restringir a atuação de associações em ações coletivas, notadamente mandados de segurança coletivos, mediante a alegação de que determinadas associações seriam consideradas genéricas, hipótese em que a propositura do mandado de segurança depende da autorização prévia dos associados em momento anterior à distribuição do remédio constitucional.

Agora, por intermédio da IN nº 2.288/2025, a Receita Federal restringiu, ainda mais, a atuação das associações na recuperação de créditos em ações coletivas, desta vez na própria fase de habilitação dos créditos.

As principais alterações implementadas pela referida instrução normativa são:

1) O pedido de habilitação do crédito de decisão judicial decorrente de mandado de segurança coletivo deverá estar acompanhado de:

i) petição inicial da ação;

ii) o estatuto da entidade impetrante vigente na data do protocolo do mandado de segurança coletivo;

iii) a cópia do contrato social ou do estatuto da pessoa jurídica vigente na data do ingresso na categoria ou da filiação;

iv) documento que comprove a data de associação ou o ingresso na categoria e, caso aplicável, a data de saída e

v) o inteiro teor da decisão judicial transitada em julgado.

2) O pedido de habilitação será deferido se o contribuinte comprovar que a associação possuía objeto determinado e específico à época da impetração e, ainda, que ele é “filiado à associação ou integrante da categoria profissional, desde que essa condição esteja amparada pela abrangência territorial e finalística do substituto definida à época da impetração do mandado de segurança coletivo”.

Spacca

Spacca

3) Por outro lado, a Receita indeferirá o pedido se o contribuinte se associar à entidade coletiva após o trânsito em julgado e, além disso, se ficar caracterizado que a associação é genérica, ou seja, não possui objeto específico e determinado.

4) Outra previsão constante na instrução normativa é a de que o contribuinte somente poderá recuperar os créditos cujos fatos geradores tenham ocorrido após a sua filiação ou ingresso na categoria, ainda que a associação não seja considerada genérica.

Risco de confundir associações

Embora o intuito da Receita Federal seja o de coibir fraudes, a tentativa de regulamentar esse tema, especialmente em instrução normativa, pode ser preocupante, pelo risco de considerar as associações com escopos abrangentes ou elásticos como se fossem associações genéricas, impedindo a habilitação do crédito.

Também se entende que duas restrições apresentadas na instrução normativa colidem com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema de Repercussão Geral nº 1.119. Particularmente, seriam as seguintes restrições:

i) vedação à habilitação do crédito no caso de contribuintes que se filiaram após o trânsito em julgado e

ii) permissão para recuperação do crédito referente aos fatos geradores implementados somente após a filiação ou ingresso do contribuinte na associação (consequentemente, indeferimento da habilitação em relação ao período anterior à filiação).

Ao estabelecer essas restrições, compreende-se que a IN nº 2.288/2025 contrariou o entendimento firmado pelo STF no julgamento do Tema nº 1.119, cuja tese foi a de que “é desnecessária a autorização expressa dos associados, a relação nominal destes, bem como a comprovação de filiação prévia, para a cobrança de valores pretéritos de título judicial decorrente de mandado de segurança coletivo impetrado por entidade associativa de caráter civil”.

Comprovação de filiação prévia

Caso seja desnecessária a comprovação da filiação prévia, a Receita não poderia impedir a habilitação dos créditos posteriores à filiação ou, ainda, a utilização da decisão judicial pelos contribuintes que se associaram em data posterior ao trânsito em julgado.

Aliás, em relação a esse último ponto, existe precedente do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que “os efeitos da decisão proferida em mandado de segurança coletivo alcançam todos os associados, ou parte deles, cuja situação jurídica seja idêntica àquela tratada na decisão da impetração coletiva, sendo irrelevante que, no caso, a filiação à Associação impetrante tenha ocorrido após a impetração do writ ou seu trânsito em julgado” (REsp nº 1.829.235/RJ, relator ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/9/2019, DJe de 11/10/2019);

Por fim, tais restrições podem ser questionadas em mandado de segurança caso sejam aplicadas em determinado caso concreto pela Receita Federal.

Ao impor condicionantes não previstas na legislação e vedar a habilitação de créditos em situações já admitidas pelo STF e pelo STJ, a norma tende a gerar aumento de contencioso, sobretudo por parte de associações regularmente constituídas e que atuam dentro dos parâmetros definidos pelo ordenamento jurídico.

Vinícius Pereira Veloso Teixeira

é advogado tributarista do escritório Marcela Guimarães Sociedade de Advogados.

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