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Alívio aos tribunais

Mediação é alternativa para evitar longos litígios, diz advogada

16 de abril de 2025, 08h14

A possibilidade de passar vários anos em um processo desgastante, com alto custo para as partes, tem feito o setor corporativo olhar com simpatia para as negociações extrajudiciais. Para a advogada Mariana Tavares Antunes, sócia do escritório Wald, Antunes, Vita e Blattner Advogados, a mediação e a arbitragem têm ajudado grandes empresas a economizar recursos e direcionar energia para outras prioridades, ao mesmo tempo em que evitam longas batalhas nos tribunais.

A advogada Mariana Tavares Antunes

“O tempo é um elemento importantíssimo. Ele representa desgaste, representa a maneira como você consegue gerir o próprio negócio. O tempo tem implicações financeiras. Ninguém mais está disposto a aguardar 30, 40 anos para a solução de um processo. É por isso que a arbitragem já vem, há algum tempo, substituindo a jurisdição estatal nas grandes disputas privadas”, avalia.

A profissional, que completou 25 anos de atuação no escritório, foi eleita uma das advogadas mais admiradas do Brasil nas áreas de Arbitragem e Cível pela Análise Advocacia Mulher 2025, da empresa Análise Editorial, e premiada no 19º Latin Lawyer Annual Awards na categoria Specialist Law Firm Leader, que trata da gestão de bancas jurídicas.

Antunes defende que um escritório de advocacia moderno precisa ter ligação estreita entre as áreas jurídica e administrativa e, principalmente, investir em pessoas. Uma boa gestão, segundo ela, deve aprimorar a formação pessoal dos advogados e formar equipes que reúnam habilidades diversas.

Leia a seguir a entrevista:

ConJur — Quais são, atualmente, as principais exigências para uma boa gestão de escritório de advocacia?
Mariana Antunes — Não existe uma regra geral que se aplique igualmente a todos os escritórios. Uma gestão eficiente é feita a partir de um profundo conhecimento do negócio. No caso do Wald, há alguns anos fizemos uma reorganização profunda, com o objetivo de personalizar a gestão e adequá-la às características personalíssimas do nosso negócio. Deu muito trabalho, mas valeu à pena, pois hoje temos a área jurídica e administrativa caminhando juntas, totalmente integradas, o que reflete positivamente no planejamento e nos resultados do negócio.

Outro ponto importante é o investimento em pessoas. Qualquer escritório de advocacia é formado, essencialmente, por pessoas. E as pessoas são diferentes, inclusive de gerações distintas. Não adianta esperar que as mais jovens sejam reproduções do que fomos na mesma idade. É preciso um olhar atento, cuidadoso e individualizado para compreender as particularidades de cada um. E, a partir desse conhecimento, investir em formação. Tanto as habilidades como as deficiências precisam ser identificadas e tratadas. As primeiras para serem potencializadas e as segundas para serem supridas. Com esse mapeamento, direcionamos a formação do time e, muitas vezes, trazemos para dentro de casa os cursos que entendemos importantes, montados a partir das nossas necessidades. Acredito que isso faz uma enorme diferença na formação do time e nosso time, hoje, é composto, majoritariamente por pessoas que foram formadas aqui. Eu mesma, esse ano, comemoro 25 anos de escritório.

ConJur — Como os advogados são preparados para trabalhar especificamente com mediação e arbitragem?
Mariana Antunes — Quando a mediação chegou ao Brasil, capacitamos todos os nossos advogados para atuarem na área. Um escritório estratégico, como o nosso, precisa ter um olhar amplo sobre as disputas. É necessário, em primeiro lugar, entender o problema que se tem em mãos. Quando o cliente nos procura, é comum que ele próprio não consiga ter a exata dimensão do que quer e muito menos do que precisa ser feito para atingir seu objetivo.

Acredito que o nosso diferencial é, justamente, fazer essa identificação e, na sequência, propor soluções amplas, que olham para todas as frentes. Quando necessário, trazemos especialistas, montamos o time e fazemos a gestão do problema, do início ao fim, com flexibilidade de adaptação no caminho. Isso, inclusive, é essencial, pois grandes problemas normalmente não têm solução linear. E é isso que eu chamo de advocacia especializada.

ConJur A senhora recebeu recentemente um reconhecimento do Análise Advocacia Mulher. O seu campo de atuação ainda é predominantemente masculino?
Mariana Antunes — Totalmente. Com frequência, sou a única mulher em salas de reunião e em mesas de negociação. É um fenômeno real. Eu acho até que a participação das mulheres no meio jurídico tem crescido, mas a advocacia estratégica ainda é um mundo predominantemente masculino. Só que essa história está começando a ser reescrita.

Aqui no escritório, por exemplo, há muito tempo a predominância é feminina. E isso não é mérito da minha gestão. Na verdade, a minha geração já veio para o escritório com mulheres fortes e atuantes que fizeram carreira aqui. Eu tenho muito orgulho de constatar que o Wald, na prática, é diferente do que normalmente se encontra no mercado.

ConJur — Como você descreve o panorama atual da arbitragem e da mediação no Brasil?
Mariana Antunes — No mercado corporativo de grandes causas, esse tipo de solução alternativa tem sido muito aplicada e com um sucesso incrível. Por quê? Eu acho que, cada vez mais, o tempo é um elemento importantíssimo. O tempo representa desgaste. A dedicação que uma briga exige afeta a dedicação do executivo ao próprio negócio. O tempo gera também implicações financeiras. Ninguém mais está disposto a aguardar 30, 40 anos para a solução de um processo. É por isso que a arbitragem já vem, há algum tempo, substituindo a jurisdição estatal nas grandes disputas privadas.

Já a mediação é um fenômeno mais recente aqui no Brasil. No mundo, nos Estados Unidos e em outros países, a mediação já é uma ferramenta eficiente há muito tempo. O Brasil resistiu um pouco a isso, porque a nossa cultura é de litígio. O processo de ‘virar a chave’ de pensamento, e tentar construir uma solução negociada com a outra parte, é árduo. Muito mais fácil ter alguém que decida, como ocorre nos litígios, arbitrais e judiciais.

ConJur — O que é necessário para conduzir uma boa mediação?
Mariana Antunes — Primeiramente, um bom mediador. Eu, particularmente, prefiro os mediadores que só se dedicam a essa atividade, porque é um treinamento da forma de pensar. O mediador precisa ser neutro, não pode assumir lados. E precisa ter um treinamento forte para conseguir isso. Isso se vê na vida cotidiana: quando você escuta uma história, normalmente toma partido, assume posições, mesmo que só mentalmente. Então, o mediador tem que ser muito treinado para assumir essa neutralidade e dialogar com as partes, independentemente do que ele pensa ou acha que é relevante. Em segundo lugar, advogados especializados, que consigam ajudar os clientes a enxergar os riscos concretos, sem paixão, e, a partir daí, construir uma solução. Por fim, partes que estejam preparadas para assumir determinadas perdas no processo de construção de um acordo. Porque todo mundo quer ganhar. E não existe acordo em que todo mundo ganhe. O mediador neutro e o advogado especializado ajudam muito nessa parte.

ConJur — Os clientes nem sempre entram na mediação dispostos a ceder?
Mariana Antunes — Não, é muito difícil esse processo interno. Quando as partes sentam para negociar, a expectativa é que uma vá convencer a outra do seu próprio argumento. Mas nunca acontece. Eu nunca participei de um caso em que a pessoa falou assim: “olha, você tem toda a razão, eu vou te dar tudo o que você pediu”. Isso não existe na prática. A mediação é um processo de acomodação de interesses, que nem sempre são completamente conhecidos pelas partes no início. É comum que, no curso da mediação, com o diálogo, surjam novas perspectivas e a solução seja completamente distinta do que se pleiteava judicialmente, por exemplo.

ConJur — Quando o cliente precisa escolher entre arbitragem e mediação, que critérios ele pode usar para definir a melhor opção?
Mariana Antunes — Primeiro, é preciso saber se ele está pronto para construir uma solução para o problema ou se prefere que alguém tome a decisão por ele. Na arbitragem é um agente externo — o árbitro — quem vai decidir. Cada um expõe a sua posição e alguém decide. Já na mediação, quem têm que decidir são as partes. É uma decisão conjunta, construída. Não é todo mundo que está preparado para isso.

Outro fator relevante é o tempo. As mediações, normalmente, são mais rápidas e, se não há acordo, a briga segue. De qualquer forma, ainda que a mediação não resulte em um acordo, ela é um processo de conhecimento que agrega muito. Mesmo que seja para brigar depois. Porque você passa a entender a cabeça do outro lado. E isso, se não é útil para a formalização de um acordo, é útil para alavancar a briga.

ConJur — E é comum que as mediações acabem não chegando em acordo?
Mariana Antunes — É comum. Porque o acordo tem um tempo de maturação, ele depende de janelas de oportunidade. Às vezes você não faz um acordo de primeira, volta a brigar e depois consegue chegar a um outro acordo, lá na frente.

ConJur — Qual é, atualmente, o perfil de empresas ou setores econômicos que mais procuram a arbitragem e a mediação?
Mariana Antunes — É difícil apontar setores específicos. As grandes causas, normalmente, têm passagem por mediação ou por arbitragem, por conta do tempo de duração, que é muito menor do que os processos judiciais. Qual é o grande gargalo hoje? O custo. Arbitragem e a mediação são processos caros. É por isso que não se vê essa solução de forma mais difundida. Mas existem iniciativas fortes para ampliar isso. Na mediação, por exemplo, os tribunais de justiça criaram os Cejuscs (Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania), que têm funcionado bem.

ConJur Como você vê a possibilidade de expansão das soluções conciliadas para causas médias e pequenas?
Mariana Antunes — Eu vejo um grande potencial. Acho que os tribunais têm muita habilidade e muita sensibilidade para isso, e os Cejusc estão crescendo. A tendência é que, nas audiências iniciais dessas tentativas de conciliação, se consiga capacitar mediadores cada vez mais especializados, que possam resolver também esses pequenos e médios conflitos.

Rafael Neves

é editor e repórter especial da revista Consultor Jurídico

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