A Lei 15.252, de 4 de novembro de 2025, dispõe sobre os direitos da pessoa natural usuária de serviços financeiros. Propõe-se analisar as disposições da Lei 15.252/2025 sobre a contratação de crédito em modalidade especial com juros reduzidos, com destaque aos aspectos processuais.
A pessoa natural usuária de serviços financeiros tem, entre outros, direito à contratação de crédito em modalidade especial com juros reduzidos (artigo 2º, inciso IV, da Lei 15.252/2025).
Cabe esclarecer que se considera tomador de crédito a pessoa natural contratante de operação de crédito perante instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil (artigo 3º, inciso VI, da Lei 15.252/2025).
O tomador de crédito normalmente figura como consumidor, ao contratar operação de crédito (serviço) com instituição financeira (fornecedor), em consonância com os artigos 2º e 3º da Lei 8.078/1990 [1].
Nesse contexto, deve-se reconhecer a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto no Código de Defesa do Consumidor ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes (artigo 51, § 1º, da Lei 8.078/1990).
Além disso, na situação em estudo, o tomador de crédito contrata a referida operação por meio de contrato de adesão (artigo 54 da Lei 8.078/1990).
Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, deve-se adotar a interpretação mais favorável ao aderente (artigo 423 do Código Civil) [2], isto é, ao tomador de crédito.
Os tomadores de crédito que optarem pela modalidade especial de crédito com juros reduzidos terão direito a um desconto percentual em relação às taxas praticadas em modalidades semelhantes de crédito, nos termos de regulamentação do Banco Central, observadas as diretrizes do Conselho Monetário Nacional (artigo 15 da Lei 15.252/2025).
Trata-se, nesse ponto, de juros compensatórios convencionais, em que a sua taxa é estipulada pelos contratantes (artigo 591 do Código Civil) [3].
Instrumento de crédito referente à modalidade especial com juros reduzidos pode prever que:
I – a mora do tomador de crédito possa ser comprovada por mensagem com confirmação de entrega encaminhada para o endereço eletrônico indicado pelo tomador no instrumento contratual e, concomitantemente, por mensagem enviada por sistema de mensagens móveis;

II – a citação e a intimação pessoal do tomador de crédito, quando assim exigidas por lei, ocorram por envio de mensagem eletrônica ao endereço indicado pelo tomador no instrumento contratual por meio do qual foi concedido o crédito ou a outro endereço eletrônico comunicado posteriormente ao credor;
III – os valores referidos no inciso X do artigo 833 do Código de Processo Civil, de titularidade do tomador de crédito ou do seu garantidor, que superem o montante de 20 salários mínimos sejam penhoráveis em sua integralidade;
IV – a solicitação de débito automático de valores depositados em conta de depósito ou de pagamento pré-paga de titularidade do tomador de crédito, para liquidação das parcelas da operação de crédito, seja irretratável e irrevogável até a quitação da obrigação (artigo 16 da Lei 15.252/2025).
Comunicação dos atos processuais
Nos termos do artigo 246 do Código de Processo Civil, com redação dada pela Lei 14.195/2021, a citação deve ser feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até dois dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça [4].
As empresas públicas e privadas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por esse meio (artigo 246, § 1º, do Código de Processo Civil, com redação dada pela Lei 14.195/2021).
As intimações realizam-se, sempre que possível, por meio eletrônico, na forma da lei (artigo 270 do CPC).
Na atualidade, a comunicação oficial dos atos processuais por meio eletrônico deve observar o disposto na Resolução 455/2022 do Conselho Nacional de Justiça (artigo 10).
O Domicílio Judicial Eletrônico deve ser utilizado exclusivamente para citação por meio eletrônico e comunicações processuais que exijam vista, ciência ou intimação pessoal da parte ou de terceiros, com exceção da citação por edital, a ser realizada via Diário de Justiça Eletrônico Nacional (Djen — artigo 18 do Conselho Nacional de Justiça, com redação dada pela Resolução 569/2024).
Mesmo para a União, para os estados, para o Distrito Federal, para os municípios, para as entidades da administração indireta e para as empresas públicas e privadas, o que se exige é o cadastro no Domicílio Judicial Eletrônico, para efeitos de recebimento de citações e intimações, conforme disposto no artigo 246, caput e § 1º, do CPC, com a alteração realizada pela Lei 14.195/2021 (artigo 16 do Conselho Nacional de Justiça). Não se trata, assim, de envio de mensagem eletrônica a endereço indicado pelo devedor (e-mail).
Na verdade, os sistemas previstos na Resolução 455/2022 devem conter funcionalidade que permita, em caráter informativo, efetivar a remessa de correspondência eletrônica, por qualquer ferramenta (e-mail, SMS, aplicativos de comunicação) aos que manifestarem interesse por esse serviço (artigo 26).
Outros aspectos processuais
As pessoas físicas, nos termos do artigo 77, inciso VII, do CPC, podem realizar cadastro no Domicílio Judicial Eletrônico para efetuar consultas públicas, bem como para o recebimento de citações e intimações, por meio: I – do Sistema de Login Único da Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ-Br), via autenticação no serviço “gov.br” do Poder Executivo Federal, com nível de conta prata ou ouro; II – de autenticação com uso de certificado digital (artigo 16, § 2º, da Resolução 455/2022 do CNJ).
Logo, para as pessoas naturais, como é o caso do tomador de crédito (artigo 3º, inciso VI, da Lei 15.252/2025), o cadastro no Domicílio Judicial Eletrônico não é obrigatório.
Apesar do exposto, na modalidade especial de crédito com taxa de juros de mora reduzidos, segundo o artigo 16, inciso II, da Lei 15.252/2025, as partes podem estabelecer convenção processual, prevendo que a citação e a intimação pessoal do tomador de crédito sejam feitas por envio de mensagem eletrônica ao endereço informado pelo tomador de crédito. Trata-se de negócio jurídico processual típico, pois previsto na Lei 15.252/2025.
Embora voltado aos negócios processuais atípicos, ou seja, não previstos em lei, de acordo com o artigo 190 do CPC, se o processo versar sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.
O juiz, de ofício ou a requerimento, deve controlar a validade das convenções processuais, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade (artigo 190, parágrafo único, do CPC).
Entende-se que os negócios jurídicos processuais, em sentido amplo, não podem modificar normas de ordem pública, nem previsões inerentes ao exercício da jurisdição [5].
De acordo com o artigo 833, inciso X, do CPC, é impenhorável a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários mínimos [6].
A respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça firmou o seguinte entendimento: “A garantia da impenhorabilidade é aplicável automaticamente, no patamar de até 40 salários mínimos, ao valor depositado exclusivamente em caderneta de poupança. Se a medida de bloqueio/penhora judicial, por meio físico ou eletrônico (Bacenjud), atingir dinheiro mantido em conta-corrente ou quaisquer outras aplicações financeiras, poderá eventualmente a garantia da impenhorabilidade ser estendida a tal investimento – respeitado o teto de 40 salários mínimos -, desde que comprovado, pela parte processual atingida pelo ato constritivo, que o referido montante constitui reserva de patrimônio destinada a assegurar o mínimo existencial” (STJ, Corte Especial, REsp 1.677.144/RS, 2017/0136287-5, relator: ministro Herman Benjamin, DJe 23/5/2024).
Apesar do exposto, na modalidade especial de crédito com taxa de juros de mora reduzidos, nos termos do artigo 16, inciso III, da Lei 15.252/2025, as partes podem estabelecer convenção processual, prevendo que os valores depositados em caderneta de poupança, de titularidade do tomador de crédito ou do seu garantidor, que superem o montante de 20 salários mínimos sejam penhoráveis em sua integralidade. Trata-se de negócio jurídico processual típico, pois previsto na Lei 15.252/2025.
Na relação jurídica material envolvida, o tomador de crédito é pessoa natural, em regra consumidor, sendo justamente a parte vulnerável (artigo 4º, inciso I, da Lei 8.078/1990), ao celebrar contrato de adesão com a instituição financeira.
Logo, cabe ao juiz decidir a respeito da validade das convenções processuais (em sentido amplo), afastando a sua aplicação nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que a parte prejudicada esteja em situação de manifesta vulnerabilidade.
Desde que comprovada a mora, na forma do inciso I do artigo 16 da Lei 15.252/2025, o credor poderá requerer ao Poder Judiciário, em desfavor do devedor, a penhora liminar de bens móveis e dos valores estabelecidos no inciso III do artigo 16 da Lei 15.252/2025, ou seja, depositados em caderneta de poupança, de titularidade do tomador de crédito ou do seu garantidor, que superem o montante de 20 salários mínimos (artigo 16, § 4º, da Lei 15.252/2025).
A rigor, no sistema processual, não se verifica a disciplina legal de “penhora liminar” de valores depositados em caderneta de poupança que superem o montante de 20 salários mínimos, para a imediata satisfação do crédito.
A penhora é ato processual realizado no âmbito do processo de execução ou da fase de cumprimento da sentença, conforme o título executivo seja judicial (artigo 515 do CPC) ou extrajudicial (artigo 784 do CPC).
A execução para cobrança de crédito deve sempre se fundar em título de obrigação certa, líquida e exigível (artigo 783 do CPC) [7].
O que se admite é o requerimento da tutela provisória de urgência de natureza cautelar, a qual pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental (artigo 294, parágrafo único, do CPC).
Nesse aspecto, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (artigo 300 do CPC). Logo, não é suficiente a simples comprovação da mora.
A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada, entre outras medidas para asseguração do direito, mediante arresto (artigo 301 do CPC), o qual tem como objetivo a constrição judicial de bens, em razão do perigo de dano, visando à futura execução por quantia certa.
Não obstante o exposto, se comprovada a mora do tomador de crédito por mensagem com confirmação de entrega encaminhada para o endereço eletrônico indicado pelo tomador no instrumento contratual e, concomitantemente, por mensagem enviada por sistema de mensagens móveis, o artigo 16, § 4º, da Lei 15.252/2025 possibilita ao credor (instituição financeira) pleitear judicialmente, em desfavor do devedor, a penhora liminar de bens móveis e dos valores depositados em caderneta de poupança, de titularidade do tomador de crédito ou do seu garantidor, que superem o montante de 20 salários mínimos.
Na modalidade especial de crédito com taxa de juros de mora reduzidos, as convenções processuais estabelecidas pelas partes, conferindo prerrogativas ao credor, mesmo que previstas na Lei 15.252/2025, devem observar o princípio fundamental do contraditório (artigo 5º, inciso LV, da Constituição de 1988).
Nessa linha, o negócio jurídico processual, ainda que típico, deve respeitar os preceitos inerentes ao devido processo legal (artigo 5º, inciso LIV, da Constituição de 1988), notadamente se aquele é estabelecido em contrato de adesão, autorizando a constrição liminar de bens móveis e de valores depositados, em desfavor da parte vulnerável.
O tomador de crédito deve consentir com as regras previstas no artigo 16 da Lei 15.252/2025 mediante assinatura de termo específico, redigido em linguagem clara e objetiva, do qual devem constar: I – a descrição das prerrogativas concedidas ao credor e a taxa de juros do crédito decorrente da concessão dessas prerrogativas; II – as regras e a taxa de juros aplicáveis em caso de não concessão das prerrogativas previstas no artigo 16 da Lei 15.252/2025; III – a declaração expressa do tomador de crédito de concordância com a concessão das prerrogativas previstas no artigo 16 da Lei 15.252/2025 e de preferência pelo uso da modalidade de crédito com juros reduzidos (artigo 16, § 1º, da Lei 15.252/2025).
Na modalidade especial de crédito com taxa de juros de mora reduzidos, é necessário o consentimento expresso do tomador de crédito a respeito das prerrogativas concedidas ao credor, ou seja, das previsões sobre: comprovação da mora do tomador de crédito; citação e intimação pessoal do tomador de crédito; penhorabilidade dos valores depositados em caderneta de poupança que superem o montante de 20 salários mínimos; solicitação de débito automático irretratável e irrevogável.
Deve-se observar, ainda, o direito à informação (artigos 2º, inciso III, e 12 da Lei 15.252/2025).
A Lei 15.252/2025, apesar de formalmente prever direitos da pessoa natural usuária de serviços financeiros, ao dispor sobre a contratação de crédito em modalidade especial com juros reduzidos, estabelece a possibilidade de previsão de diversas prerrogativas concedidas ao credor (instituição financeira), de natureza material e processual, em desfavor do tomador de crédito.
As regras previstas no artigo 16 da Lei 15.252/2025, sob a justificativa do direito do devedor a desconto percentual em relação às taxas de juros praticadas em modalidades semelhantes de crédito, acentuam o desequilíbrio entre os contratantes.
Portanto, os dispositivos envolvidos devem ser interpretados à luz dos preceitos e garantias constitucionais, de modo que as medidas previstas observem o mandamento da proporcionalidade.
Cabe, assim, acompanhar a regulamentação (artigo 17 da Lei 15.252/2025), bem como a evolução doutrinária e jurisprudencial a respeito das novas previsões do referido diploma legal.
[1] Cf. Súmula 297 do STJ.
[2] GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Direito civil: contratos e atos unilaterais. São Paulo: Juspodivm, 2025. p. 60-61.
[3] GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Direito civil: parte geral e obrigações. 2. ed. São Paulo: Juspodivm, 2024. p. 854-855.
[4] GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Juspodivm, 2024. p. 263-264.
[5] Cf. STJ, 4ª T., REsp 1.810.444/SP, 2018/0337644-0, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 28.04.2021.
[6] Cf. STJ, Corte Especial, REsp 2.061.973/PR, 2023/0116082-5, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 07.10.2024 (Tema 1.235).
[7] Cf. Súmulas 233 e 300 do STJ.
Seja o primeiro a comentar.
Você precisa estar logado para enviar um comentário.
Fazer login