A autorização para a produção de relatórios de inteligência financeira (RIF) por encomenda transformaria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em órgão de assessoria do Ministério Público e dos delegados de polícia, alterando, assim, sua função institucional.

IBDPE pediu ingresso como na ação em que o STF vai julgar o RIF por encomenda
A crítica é do Instituto Brasileiro de Direito Penal Econômico (IBDPE), que pediu ingresso como amicus curiae (amigo da corte) no recurso em que o Supremo Tribunal Federal vai julgar a constitucionalidade dos RIFs produzidos a pedido dos investigadores.
A atuação da entidade ainda será avaliada pelo relator do recurso, ministro Alexandre de Moraes. O tema é gerador de uma cisão jurisprudencial no Brasil, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico.
Sigilos bancário e fiscal
Na petição, o IBDPE sustenta que a proteção a dados fiscais e bancários, garantida por princípios constitucionais relacionados à intimidade e à vida privada dos cidadãos, só pode ser afastada nas hipóteses previstas em lei.
Para o sigilo bancário, a regra está no artigo 1º, parágrafo 4º, da Lei Complementar 105/2001; para o fiscal, no artigo 198, parágrafo 1º, inciso I, do Código Tributário Nacional. Nos dois casos é necessária autorização judicial prévia.
Essa decisão ficaria a cargo do juiz das garantias, introduzido pela lei “anticrime” de 2019. Admitir a requisição direta de informações ao Coaf seria uma forma de burlar o procedimento, a reserva de jurisdição e o controle judicial, segundo o IBDPE.
Assim, não basta que a Lei 9.613/1998, em seu artigo 15, autorize o Coaf a compartilhar dados fiscais com as autoridades competentes, porque essa previsão é para a hipótese específica em que o órgão concluir pela possível existência de crimes.
Devassa financeira
A consequência, de acordo com o IBDPE, é dar ao procedimento um caráter de devassa na vida financeira privada do investigado e de terceiros insuspeitos.
“Autorizar o RIF a pedido, sem a intervenção do Poder Judiciário, afeta a própria configuração institucional do Coaf, que se tornaria um órgão de assessoria do Ministério Público e das autoridades policiais, deixando de ser um órgão de inteligência financeira para se transformar em extensão dos órgãos de persecução criminal”, diz a petição.
“Haveria, assim, uma fusão informacional entre órgão de inteligência e órgão de persecução penal, um desvio de finalidade do primeiro sem autorização expressa em lei.”
O IBDPE destaca que a modernização do sistema financeiro e o elevado volume de dados disponíveis tornam ainda mais relevante que a gestão do poder de informação do Estado se submeta a um controle jurisdicional rigoroso, para evitar abusos.
“O que se demonstra inadequado neste sistema é a requisição direta sem autorização judicial prévia de RIF que, adiante, serão utilizadas enquanto prova de atividade ilícita ou corroboração de uma ideia já pré-concebida pela autoridade que o requisita.”
Relatórios em alta
O tema é importante por causa do grande crescimento da produção de relatórios feitos a pedido dos órgãos. Em dez anos, o número de RIFs por encomenda aumentou 1.300%. No ano passado, o Coaf entregou uma média de 51 relatórios por dia.
O risco, segundo os especialistas, é transformar o imenso banco de dados do Coaf em um repositório à disposição dos investigadores, com informações que não representam prova, mas apenas indicam como obtê-la.
Clique aqui para ler a petição do IBDPE
RE 1.537.165
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