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Produtor rural que não pagou trator não pode ter nome negativado

20 de novembro de 2025, 07h54

A discussão legítima sobre a exigibilidade de uma dívida de crédito rural, aliada ao risco de dano grave e de difícil reparação para o produtor, justifica a proibição da inscrição do devedor nos cadastros de inadimplentes. Nesse caso, o prejuízo de ter o nome negativado é evidente porque a restrição ao crédito é um obstáculo à continuidade da atividade produtiva, com potencial comprometimento da subsistência familiar.

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Para desembargador, nome negativado impediria acesso do agricultor ao crédito

Com base nesse princípio, o desembargador Márcio André Keppler Fraga, da 23ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, determinou que uma instituição financeira não inclua o nome de um produtor rural nos órgãos de proteção ao crédito (SPC, Serasa, Cadin e outros) em consequência de uma dívida no pagamento de um trator.

O agricultor procurou a Justiça por meio de uma ação declaratória de prorrogação compulsória de contratos rurais. Além de pedir para não ser negativado, o autor da ação solicitou o alongamento de uma cédula de crédito rural. Ele alegou que não conseguiu honrar o financiamento por causa de prejuízos provocados por eventos climáticos, como estiagem e enchentes.

O juízo de primeira instância indeferiu o pedido, pois entendeu que a declaração de inexigibilidade do débito era prematura e dependia da instrução processual.

O produtor rural recorreu argumentando que a situação de déficit hídrico, comprovada por laudos técnicos, justifica a prorrogação da dívida rural. Ele evocou a Súmula 298 do Superior Tribunal de Justiça, que afirma que o alongamento da dívida de crédito rural é um direito do devedor, e não uma faculdade da instituição financeira.

Copo meio cheio

O desembargador negou a suspensão da exigibilidade do débito. Ele observou que, embora o direito à prorrogação seja amparado pela Súmula 298 do STJ, ele não é absoluto. A concessão exigiria a demonstração inequívoca de que o produtor preenche todos os requisitos normativos do Manual de Crédito Rural (MCR) — como comprovação do evento danoso, comprometimento significativo da capacidade de pagamento e outros critérios técnicos. A análise preliminar indicou que havia controvérsia sobre se o autor preenchia esses requisitos, o que demandaria provas mais robustas.

O magistrado considerou, porém, que a não inclusão do agricultor no cadastro de inadimplentes é necessária. Ele ressaltou que o produtor rural depende do acesso ao crédito para o desenvolvimento de sua atividade produtiva. A restrição cadastral, nesse contexto, poderia inviabilizar o acesso a novos financiamentos, necessários para o plantio da próxima safra.

A solução buscou equilibrar os interesses em conflito, protegendo o produtor contra os efeitos mais graves da inadimplência enquanto a exigibilidade da dívida é discutida judicialmente.

“Tais elementos, ainda que insuficientes para a suspensão da exigibilidade do débito, são suficientes para justificar, em sede de cognição sumária, a proteção do agravante contra os efeitos negativos da inscrição de seu nome nos cadastros de inadimplentes, especialmente considerando que há discussão legítima sobre a exigibilidade da dívida”, afirmou o desembargador.

Ele fixou multa diária no valor de R$ 500, limitada a R$ 20 mil, caso a instituição financeira descumpra a ordem de não incluir o nome do produtor rural nos cadastros.

Os advogados Kairo Rodrigues e Matheus Vaz, do escritório Braun, Vaz e Rodrigues Advocacia, representaram o agricultor na ação.

Clique aqui para ler o acórdão
Agravo de Instrumento 5313116-31.2025.8.21.7000

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